O Girassol da Caverna - Elba Ramalho, Ney Matogrosso

Holofote riscando a treva aberta

Suicídio da luz no breu sem fim

Iluminando tudo ao redor de mim

Tenho o riso febril de quem se oferta

Sou pedaço de terra descoberta

Por um navegador que sou eu mesmo

E por mais que a nau viaje a esmo

Em meu peito a rota é sempre certa

Eu sou um girassol e busco a luz

Mas nasci dentro de uma caverna

Com algemas de folhas presa à perna

E horizonte nenhum que me guiasse

Eu pensei que aí tudo acabasse

Quando em mim teu amor fez moradia

Hasteou esse sol que acenderia

O planeta inteiro se precisasse

Eu sou um girassol indignado

E a voz que me rege é a verdade

Minhas pétalas clamam liberdade

Para o meu coração agoniado

Nesse circo de arame farpado

Palhaço de poucas ilusões

Cantando na festa dos leões

Com metade do riso amordaçado

Bastaria vagar pela cidade

Para ver a angústia em cada face

E por mais que os olhos eu fechasse

Sentiria o cheiro da carniça

E o dedo maior da mão postiça

Semeou pelas praças, pelos becos

Quem chorava já tem os olhos secos

De esperar os fantasmas da justiça

Eu não li o epílogo da peça

Mas pressinto no jeito dos atores

O começo do fim desses horrores

A maldade que na razão tropeça

E o circo da história já tem pressa

Pra bater o martelo contra a mesa

E cantar voz bem alta à natureza

Pra esse sol exilado que regressa

Searchlight scratching the open darkness

Endless light suicide

Illuminating everything around me

I have the febrile smile of who offers

I am a piece of discovered land

By a browser that is myself

And however much the nau travels aimlessly

In my chest, the route is always right

I am a sunflower and I seek the light

But I was born inside a cave

With leaf handcuffs attached to the leg

And no horizon to guide me

I thought that it would all end there

When in me your love made a home

Raised that sun that would light up

The entire planet if needed

I'm an outraged sunflower

And the voice that governs me is the truth

My petals cry out for freedom

For my agonized heart

In this barbed wire circus

Clown of few illusions

Singing at the lions' party

With half the gagged smile

Just wander around town

To see the anguish in each face

And as much as I closed my eyes

I would smell the carrion

And the big finger of the fake hand

Sowed through the squares, through the alleys

Those who cried already have dry eyes

Waiting for the ghosts of justice

I haven't read the epilogue of the play

But I have a feeling in the way of the actors

The beginning of the end of these horrors

The evilness that stumbles on reason

And the circus of history is already in a hurry

To hit the hammer against the table

And singing very loudly to nature

For that exiled sun that returns