Ter ou não ter - Belchior

Quando eu vim para a cidade, eu ganhava a minha vida

Ave-pássaro cantando na noite do cabaré

E era mais pobre do que eu a mulher com quem dividia

Dia e noite, sol e cama, cobertor, quarto e café

O Nordeste é muito longe.

Eh!

saudade.

A cidade

É sempre violenta

Pra quem não tem pra onde ir, a noite nunca tem fim

O meu canto tinha um dono e esse dono do meu canto

Pra me explorar, me queria sempre bêbado de gim

O patrão do meu trabalho era um tipo de mãos apressadas

Em roubar, derramar sangue de quem é fraco, inocente

Tirava o pão das mulheres — suor de abraços noturnos

Confiante que o dinheiro vence infalivelmente

Ele ganhava as meninas com seu jeito de bonito:

A roupa novinha em folha, cravo vermelho na mão

Charuto aceso na boca e bolsa cheia de promessas

De que um dia entregaria a qualquer uma o coração

Mas noite é vida e vida é jogo e jogo é sorte e sorte

É vária;

Coisa muito complicada: o amigo tem ou não tem

Quem não tem sucesso ou grana tem que ter sorte

Bastante

Para escapar salvo e são das balas de quem lhe quer bem

Por isso eu fui Navalha, falei com Papel de Seda

Malandros amigos meus, que tinham vindo há mais tempo

Deles aprendi a arte de conviver com o perigo

De respeitar sem temer qualquer espécie de gente

Contei tudo.

Eles iriam ver meu show na meia noite…

Falava a palavra AMOR, a letra da minha canção

… O tipo, sentado à mesa, rugia e amassava o cravo

Sangue: um golpe na garganta e um tiro no coração

Eu não quero falar nada;

eu quero é completar meu canto

Pois sei que o show continua, que continua o viver

Mas é bom tomar cuidado com quem entende o riscado:

To be or not to be quer dizer: ter ou não ter

When I came to the city, I earned my own living

Bird-bird singing in the night of the cabaret

And he was poorer than I the wife with whom he shared

Day and night, sun and bed, blanket, room and coffee

The Northeast is too far away.

Eh!

longing.

The city

It's always violent

For those who have nowhere to go, the night never ends

My corner had an owner and this owner of my corner

To explore myself, he always wanted me drunk on gin

The boss of my work was a hurried-hands type

To steal, spill the blood of those who are weak, innocent

Took bread from women — sweat from night hugs

Confident that money wins infallibly

He won over the girls with his handsome way:

Brand new clothes, red carnation in hand

Lit cigar in mouth and bag full of promises

That one day I would give any one heart 

But night is life and life is game and game is luck and luck

Is various;

Very complicated thing: the friend has or doesn't have

Who doesn't have success or money has to be lucky

Quite

To escape safely and are from the bullets of those who love you

That's why I went to Razor, I talked to Tissue Paper

Naughty friends of mine, who had come a long time ago

From them I learned the art of living with danger

To respect without fearing any kind of people

I told you everything.

They were going to see my show at midnight…

I spoke the word LOVE, the lyrics of my song

… The guy, sitting at the table, roared and crushed the harpsichord

Blood: a blow to the throat and a shot to the heart

I don't want to say anything;

I want to complete my song

Because I know that the show goes on, that it goes on living

But it's good to be careful with those who understand the risk:

To be or not to be means: to have or not to have